A cristalografia e os remédios que tomamos todos os dias

Muitos medicamentos que usamos são comercializados na forma sólida (comprimidos e cápsulas), principalmente devido a estabilidade e boa aceitação pelos pacientes. A grande maioria (cerca de 80%) dessas formas sólidas são cristalinas, ou seja, as moléculas dos fármacos estão organizadas no sólido de forma regular.

A substância química que produz o efeito biológico no paciente é normalmente denominada de Insumo Farmacêutico Ativo (IFA) e pode ser administrada nas formas mono e multicomponentes. As formas monocomponentes são formadas apenas pelo IFA, enquanto as multicomponentes apresentam outros compostos além do IFA. Para as duas formas de produção dos remédios podemos observar o fenômeno de polimorfismo, que é a capacidade de uma mesma molécula se organizar de forma diferente no sólido cristalino. Em alguns casos, a mudança da forma pode provocar modificações físico-químicas do medicamento, em especial na solubilidade, ocasionando problemas de biodisponibilidade para os pacientes e afetando negativamente o tratamento. Do ponto de vista da indústria farmacêutica, para se evitar a presença de polimorfos indesejáveis, é necessário um controle rigoroso do modo de produção dos fármacos. Por exemplo, o paracetamol apresenta duas formas polimórficas (formas I e II), porém a forma II é um pouco mais solúvel e menos estável, deste modo, a forma I é a forma comercial. Portanto, o conhecimento da forma desse IFA na matéria prima é essencial para a produção do remédio.

Uma das principais técnicas de caracterização de sólidos cristalinos é a difração de raios X. Essa técnica permite a determinação precisa da organização das moléculas no sólido e desta forma a identificação e até quantificação do polimorfo do IFA presente tanto na matéria prima (insumos farmacêuticos) quanto no produto acabado (comprimidos ou cápsulas).

A difração de raios X é uma ferramenta de caracterização fundamental para o controle de qualidade de medicamentos que consumimos, pois os permite descobrir se o medicamento que será comercializado está na forma sólida correta para gerar o efeito biológico desejado.